Os imensos shoppings podem oferecer algumas oportunidades de encontros, mas em geral são grandes demais para a criação da justiça horizontal. Grandes demais para encontrar os velhos conhecidos e muito agitados e cheios de gente para os longos bate-papos necessários ao estabelecimento de padrões de comportamento …
Acrescentemos que os shoppings são construídos de forma a manter as pessoas em circulação, olhando ao redor, divertindo-se e entretendo-se sem parar — mas de forma alguma por muito tempo – com inúmeras atrações; não para encorajá-las a parar, a se olhar e conversar, a pensar em analisar e discutir alguma coisa além dos objetos em exposição – não são feitos para passar o tempo de maneira comercialmente desinteressada…
O balanço alegórico de Christie tem o mérito adicional de trazer à luz os efeitos éticos da degradação dos espaços públicos. Os locais de encontro eram também aqueles em que se criavam as normas — de modo que se pudesse fazer justiça e distribuí-la horizontalmente, assim reunindo os interlocutores numa comunidade, definida e integrada pelos critérios comuns de avaliação. Por isso um território despojado de espaço público dá pouca chance para que as normas sejam debatidas, para que os valores sejam confrontados e negociados. Os vereditos de certo e errado, belo e feio, adequado e inadequado, útil e inútil só podem ser decretados de cima, de regiões que jamais deverão ser penetradas senão por um olhar extremamente inquisitivo; os vereditos são inquestionáveis desde que nenhum questionamento significativo possa ser feito aos juízes e desde que os juízes não deixem endereço – sequer um endereço eletrônico, um e-mail – e ninguém saiba com certeza onde residem.
– Zygmunt Bauman em Globalização: As consequências humanas.