Não foi em vão que fui filólogo, e talvez ainda o seja. Filólogo quer dizer professor de leitura lenta: acaba-se por escrever também lentamente. Agora isso não só faz parte de meus hábitos, mas até meu gosto se adaptou a isso — um gosto maldoso talvez? — Não escrever nada que não deixe desesperada a espécie dos homens “apressados”. De fato, a filologia é essa arte venerável que exige de seus admiradores antes de tudo uma coisa: manter-se afastado, tomar tempo, tornar-se silencioso, tornar-se lento — uma arte de ourivesaria e um domínio de ourives aplicado à palavra, uma arte que requer um trabalho sutil e delicado e que nada realiza se não for aplicado com lentidão. Mas é precisamente por isso que hoje é mais necessário que nunca, justamente por isso que encanta e seduz, muito mais numa época de “trabalho”: quero dizer, de precipitação, de pressa indecente que se aquece e quer “acabar” tudo bem depressa, mesmo que se trate de um livro, antigo ou novo. — Essa própria arte não acaba facilmente com o que quer que seja, ensina a ler bem, isto é, lentamente, com profundidade, com prudência e precaução, com segundas intenções, portas abertas, com dedos e olhos delicados… Amigos pacientes, este livro não deseja para ele senão leitores e filólogos perfeitos: aprendam a me ler bem!
– Nietzsche em Aurora.