Impressiona-me a forma como perseguimos a notícia. O furo de reportagem nos incentiva a superar os limites da máquina e do homem. Chegamos ao local do crime. Os rostos dos miseráveis parecem felizes com a nossa presença naquele lugar desconhecido. Sonham sair do ostracismo pelo caminho mais trágico: a notícia da morte violenta.
Uma cena chocante: as pessoas sorriam enquanto rodeavam o morto. Achavam o máximo a possibilidade de ver alguém daquele fim de mundo nas páginas policiais do dia seguinte. Gritos de protesto? Nenhum. Busca por justiça? Inútil. Presente à cena do crime, a polícia cuidava de colher dados sobre o morto: idade, profissão, ligações com entorpecentes. Só. Entraria nas estatísticas. Dos pobres, é claro. Jamais um inquérito bem formulado como possuem as atrocidades cometidas contra pessoas da classe média e da classe alta. No mais, ninguém viu nada. Nem ouviu. Ninguém desconfiava de nada e de ninguém. Não havia motivos para que aquilo tivesse acontecido.
E eis que a mãe da vítima, sentada no meio-fio, junto ao corpo do filho, vira-se para o repórter, verdadeiro abutre da tragédia, e oferece-lhe uma foto do filho morto, para que apareça no jornal do dia seguinte, no espaço destinado aos consumidores da barbárie.
Quem será pior? Os abutres que perseguem a morte para registrá-la ou os que ratificam a loucura, devorando no jornal cada detalhe de um assassinato? Ou seremos todos, nós e eles, a serpente que devora a própria cauda?
– Tiago Cunha